26 e 27 - BATISTAS NO BRASIL

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As duas vias

segunda-feira, 2 de outubro de 2017

2 - ANGLICANISMO, A IGREJA DO REI

“Deus colocou todas as coisas debaixo de seus pés (de Cristo), e o designou cabeça de todas as coisas para a Igreja, que é o seu corpo...” (Efésios 1. 22-23a)

Um dos desvios da Igreja Romana foi a hierarquização do Papa como cabeça da Igreja. Nas Ilhas Britânicas, esta visão foi mudada com a Reforma.
A Inglaterra tem uma tradição cristã que remonta aos primeiros séculos. Por volta do século VII, a maioria dos ingleses já era católica romana; nos séculos seguintes, começaram a florescer grupos dissidentes à igreja dominante, e remanescentes desses grupos, tais como os lolardos (seguidores de John Wyclif – século XIV), presentes na vida inglesa ao longo do século XV e mesmo no XVI, constituíram-se em oposição ao romanismo. Por volta do século XVI, muitos cristãos ingleses ansiavam por reformas na igreja, estando a classe média emergente também insatisfeita com os excessivos impostos pagos a Roma, bem como com a existência de inúmeras propriedades da Igreja Romana na Inglaterra. Foi esse o ambiente sócio-político-religioso que encontrou o rei Henrique VIII, ao assumir o trono, em 1509.
“... um soberano elegante, generoso, forte, culto, conhecedor de teologia e bom músico; falava latim, francês e espanhol tão bem quanto o inglês; gostava da caça, arco e tênis”; assim apresenta Cairns ao Rei Henrique VIII. Embora alinhasse tantas qualidades formativas, sua vida amorosa, porém, foi uma sucessão de esposas e amantes em nada edificante. Resumindo a história: o rei teve seis esposas, sendo que apenas a última sobreviveu a ele. Como Catarina de Aragão (sua primeira esposa, filha dos reis católicos de Espanha Fernando e Isabel) não pode gerar o herdeiro masculino que o rei desejava para assumir o trono, Henrique VIII procurou a aprovação papal para a dissolução do seu matrimônio, tendo já em vista um segundo casamento com Ana Bolena. Esta é a causa primeira apontada para o rompimento com Roma e com o catolicismo, dando início ao Anglicanismo na Inglaterra. Uma carta foi enviada ao papa, na qual a nobreza inglesa pedia a anulação do casamento, documento marcado por oitenta e cinco sinetes de nobres e clérigos, apoiando o pedido real. Com a recusa de Roma em atender ao pedido de anulação, a Igreja da Inglaterra foi criada através do Decreto de Supremacia de 1534, separando-se do controle de Roma; Henrique rompeu com o papa de Roma ao se autoproclamar o cabeça da Igreja Anglicana, além de confiscar as propriedades da Igreja Católica Romana nos territórios da Inglaterra. O rei, no entanto, que havia sido condecorado pelo papa anteriormente (dado o seu empenho ao tentar barrar as influências protestantes que vinham do continente), continuava católico e apostólico, tendo apenas deixado de lado o adjetivo romano. Por ocasião da sua morte, “a Igreja Inglesa era uma igreja nacional dirigida pelo rei, mas católica romana na doutrina”, conforme afirma Earle Cairns. 
Em 1547, assumiu o trono Eduardo VI, filho de Jane Seymor, terceira esposa real, tendo “reinado” até 1553. Sendo uma criança com saúde débil, a reforma da Igreja Anglicana começou a ter um contorno mais nítido sob a liderança dos seus regentes (duques de Sommerset e Northumberland), mas também surgiu aí uma nítida diferença entre o anglicanismo e o puritanismo nascente, principalmente quando o puritano John Hooper expôs claramente sua rejeição ao uso das vestes litúrgicas pelo clero da Igreja, consideradas por ele como resquício do catolicismo.
No entanto, morto o varão tão desejado por seu pai, em 1553, assumiu o trono Mary Tudor, filha do primeiro casamento com Catarina de Aragão, na linha sucessória deixada por Henrique VIII. Católica de várias gerações, a nova rainha tentou levar a Inglaterra a uma volta à Igreja Romana. Durante seu reinado de cinco anos, ela restaurou o sistema católico e começou a tentar se livrar dos protestantes. Essa atividade rendeu-lhe o cognome de "Maria Sanguinária" (Bloody Mary), em virtude da perseguição aos líderes protestantes, tendo executado cerca de trezentos dissidentes e provocado a fuga de outros oitocentos para o continente. Esse grupo de refugiados, ao voltar, desempenhou papel marcante na continuação dos acontecimentos.
Como a história é cheia de idas e vindas, com a morte de Maria em 1558, assumiu o trono a terceira herdeira de Henrique VIII, Elisabete I, a última da dinastia Tudor. Filha de Ana Bolena, Elizabeth I governou a Inglaterra de 1559 a 1603, tendo restaurado e dado sequência às reformas iniciadas por seu pai e continuadas por seu irmão. Ela optou, no entanto, por um caminho que priorizava a unidade nacional, e não questões teológicas. Não sendo uma pessoa realmente religiosa, Elizabeth mantinha um catolicismo de aparências, tendo sido levada a aceitar o protestantismo por injunções políticas. A rainha, não desejando perder nenhum tipo de vantagem política, organizou um compromisso entre católicos e protestantes através de um decreto chamado de Acordo Elizabetano, crendo, com isso, ter resolvido as guerras religiosas da Inglaterra. Como cabeça da Igreja, tendo diante de si a missão de conduzir as ações que acabariam por definir que tipo de teologia deveria ser praticado na Inglaterra por seus súditos, a rainha, embora convicta da necessidade de mudanças, mas temerosa da reação popular que elas poderiam causar, optou por medidas que fizessem com que o culto da igreja “se parecesse ao antigo culto tanto quanto o sentimento protestante pudesse tolerar”, segundo afirmação do historiador Walker.
Os oitocentos refugiados do reinado de Maria, anterior a Elizabeth, acabaram por originar, na Igreja Anglicana, um grupo que passou a ansiar e a lutar pela reforma mais completa da igreja, desejando purificá-la ao eliminar todos os resquícios que lembrassem o catolicismo; esse grupo passou a ser conhecido na história como os Puritanos.
Partindo do Catolicismo, no qual o cabeça da Igreja é o papa, passamos pelo Anglicanismo, no qual o cabeça passou a ser o rei. Em ambas as igrejas, o cabeça da organização é um ser humano No entanto, Paulo disse aos efésios que Deus colocou a Cristo como cabeça da Igreja, e isto precisava ser reformado. Todos os fatos históricos aqui narrados são importantes para que possamos compreender a origem dos batistas, pois, tendo como ponto de partida os anglicanos, passando pelos puritanos, encontramos os separatistas, aqueles puritanos que se cansaram de esperar pelas mudanças (que aconteciam de modo muito lento, dependendo da política), até chegar à organização da primeira congregação batista, assunto do próximo segmento.

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ÍNDICE DOS FASCÍCULOS

Introdução 1)    16 séculos de Igreja Cristã 2)    Anglicanismo: a Igreja do Rei 3)    Puritanos, Separatistas, Batistas 4)    A “C...