"E, tendo cantado o hino, saíram para
o Monte das Oliveiras.” Mateus 26.30.
O texto que inicia este estudo se
refere a Jesus e seus apóstolos. O livro de Atos não entra em detalhes sobre a
ordem de cultos da igreja primitiva ou se a música era utilizada. E
quanto aos batistas, como era o seu culto a Deus, quando a igreja iniciou suas
atividades neste mundo, 400 anos atrás?
No princípio, os cultos batistas eram
bastante longos, às vezes com vários sermões, e nos dias iniciais não havia
música ou canto. O registro mais antigo de um culto batista que se conhece é de
1609, do grupo ainda em Amsterdam, em uma carta de Hughe e Anne Bromhead, que,
relatando uma “ordem de culto” inicial, assim dizia:
“A ordem do culto e direção de nossa
igreja é: Primeiro, nós começamos com uma oração, depois a leitura de um ou
dois capítulos da Bíblia que deem sentido à reunião e a direcionem; isso feito,
nós deixamos nossos livros de lado e, após uma oração solene feita pelo 1º
orador, ele propõe algum texto próprio da Escritura e profetiza sobre o mesmo,
pelo espaço de uma hora, ou três quartos de uma hora.” (tradução livre do
autor dos fascículos, partindo do original inglês do século XVII).
A carta de Bromhead conclui dizendo que
“este exercício da manhã começa às oito horas e continua até doze horas; o
mesmo curso de exercício é observado à tarde, das 2 até 5 ou 6 horas”. O
casal mencionado, Hughe e Anne Bromhead, fez parte dos membros fundadores da
“congregação da padaria” no fascículo 5 e, na separação havida, ficaram ambos
com Smyth e os menonitas. Segue, como curiosidade histórica, o texto em inglês
antigo, linguagem característica da época, contemporânea ao inglês da versão
“King James” da Bíblia:
“The order of the worshippe and
government of oure church is . 1. we begynne wth a prayer, after reade some one
or tow chapters of the Bible gyve the sence thereof, and conferr vpon the same,
that done we lay aside oure bookes, and after a solemne prayer made by the 1.
speaker, he propoundeth some text owt of the Scripture, and prophecieth owt of
the same, by the space of one hower, or thre Quarters of an hower. This Morning
exercise begynes at eight of the clocke and continueth vnto twelve of the
clocke the like course of exercise is observed in the afternowne from .2. of
the clock vnto 5. or 6. of the Clocke."
Sobre a música no culto, o reformador Lutero
disse: “Próximo à Palavra de Deus, a música merece o mais alto louvor.
O dom da língua combinado com o dom do canto foi dado ao homem para que ele
pudesse proclamar a Palavra de Deus através da música”. Não foi essa,
porém, a compreensão dos batistas no início de suas atividades como igreja. A
música não estava presente nos primeiros e longos cultos batistas, que tinham
sua ênfase na leitura e exposição bíblica e na oração, conforme já focalizado.
Parece que havia nos pioneiros da obra um desejo de cultuar a Deus de forma a
afastar-se das práticas heréticas, numa busca do cristianismo neotestamentário.
Como a música já estava incorporada às igrejas cristãs em geral, tanto católica
quanto anglicana, os primeiros batistas não a utilizaram de início.
Diz Bill Prater, em seu texto “História
da Música na Igreja Batista”: “ ... há uma história chamada ‘Cantar ou
não cantar’. É sobre um homem com o nome de Benjamin Keach que, com a idade de
28 anos, tornou-se pastor da Igreja Batista em Horsleydown, Londres”. Keach
também viera da Igreja Anglicana, tendo sido batizado quando criança, mas, com
a idade de 15 anos, ele se juntou aos Batistas Gerais e, com 18 começou a
pregar. Mais tarde, uniu-se aos Batistas Particulares. Diz a história ter sido
ele preso várias vezes, por pregar o batismo do crente.
Salientando em Benjamin Keach seu
relacionamento difícil como ser humano, diz o autor citado que, entre as
polêmicas nas quais o pastor esteve envolvido, uma delas foi a questão de haver
ou não haver cântico congregacional em cultos públicos, a chamada “Controvérsia
do Cântico”. Acredita-se que a igreja de Keach foi provavelmente a primeira
entre os batistas a introduzir o cântico congregacional, usado inicialmente
apenas após a Ceia do Senhor. Cerca de vinte anos depois, após muito conflito,
a congregação já cantava todos os domingos, mas somente após o sermão e as
orações. O autor ressalta que os dissidentes saíam do prédio da igreja,
permanecendo no pátio de entrada porque “eles não podiam
conscientemente permanecer e ouvir o cântico”. Esses dissidentes
eventualmente se desligaram da igreja e formaram outras unidades, situação que
se repetiu no ambiente das igrejas batistas inglesas durante algum tempo.
Em 1691, Benjamin Keach
publicou um hinário intitulado “Melodia Espiritual” (Spiritual Melody),
contendo cerca de trezentos hinos sacros. O problema nos dias de Keach parecia
ser a dúvida se era carnal ou espiritual a introdução da música no culto, além
do uso de um hinário, um livro que não era a Bíblia. Durante a
“Controvérsia do Cântico”, vários argumentos foram levantados contra a
novidade; entre eles podemos destacar:
ü Não ser ordenado pela
Bíblia que devesse acontecer.
ü Nada indicar que a
igreja primitiva cantasse.
ü O cântico levar a um
formalismo, já que era encarado como uma oração escrita.
ü O cântico
congregacional comprometer a pureza da igreja, já que dele participavam salvos
e não-salvos.
Hoje, entre os batistas do século XXI,
a controvérsia do cântico permanece, não mais se questionando
ser ou não bíblico o uso da música no culto, mas que tipo de melodia, de ritmo
e que instrumentos podem ser usados no acompanhamento do cântico, tanto
congregacional, quanto coral, ou de outros grupos.
Sendo a sua forma de governo
congregacional, os batistas não possuem um governo central ou um líder maior,
sendo cada congregação autônoma nas suas decisões. Não houve, por exemplo,
interferência de um organismo central para definir a “controvérsia do cântico”.
No entanto, existem convenções, associações e outros tipos de agrupamentos que
procuram organizar a cooperação entres as igrejas. Quando foi que isto começou?
Este é o assunto do próximo fascículo.
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