“Respondeu Jesus: O meu
reino não é deste mundo.” (João 18.36b)
Os puritanos alimentaram,
durante algum tempo, a esperança de verem concretizadas na Igreja da Inglaterra
as reformas que o grupo de exilados viu acontecendo no continente europeu, como
reflexo da obra de Lutero e Calvino. Ansiavam pelo dia em que todos os “trapos
do papismo” teriam sido extirpados da igreja oficial de seu país. Por isso,
permaneceram aguardando e trabalhando pelas reformas. No entanto, tanto
Elizabeth I quanto James I estavam mais preocupados em governar e administrar
tudo politicamente, contrariando o ideal puritano de reformas mais profundas.
Em abril de 1603, o rei
James I recebeu a "Petição Milenária", na qual os puritanos faziam
pedidos de mudança, o que provocou a convocação de uma conferência em Hampton
Court entre bispos e puritanos, acontecida em janeiro de 1604, com a presença
do rei. No encontro, nenhuma das mudanças foi atendida, exceto a permissão para
elaboração e impressão de uma nova tradução da Bíblia para a língua inglesa, a
versão King James. A partir daí, o Separatismo aumentou e John
Smyth, ex-clérigo da igreja estabelecida, tornou-se pastor de uma congregação
em Gainsborough. Outras congregações foram formadas, uma delas na casa de
William Brewster, em Scrooby, dirigida por John Robinson.
Sentindo o peso da
perseguição, os membros das duas congregações, a de Gainsborough, e a de
Scrooby, seguiram o mesmo caminho para a Holanda, a partir de 1607. William
Bradford, então com 12 anos de idade, tornou-se um ativo membro da congregação
de Scrooby, ele que, mais tarde, seria o primeiro governador da colônia de
Plymouth, na Nova Inglaterra. Na Holanda, embora os grupos ainda mantivessem
correspondência, a congregação de Smyth e Helwys fixou-se em Amsterdam,
enquanto o de Brewster e Robinson passou a residir em Leyden.
Dois grupos de puritanos
separatistas diferentes, comungando inicialmente dos mesmos ideais de reforma
da igreja, buscando uma aproximação do modelo do Novo Testamento, refugiados no
mesmo país, mas sediados em cidades diferentes, viveram histórias com finais
diferentes. O grupo de Smyth em Amsterdam partiu para a criação da Congregação
da Padaria, que deu origem aos batistas, como já se viu.
O grupo de Robinson em
Leyden parecia estar mais preocupado com o destino da nova geração, para quem
seus integrantes viam dificuldades, tanto na vida em um país estrangeiro, com
costumes diferentes, quanto na volta eventual à Inglaterra, onde não havia
perspectiva de mudança no panorama político-religioso. Na Holanda, cultura
e língua eram estranhas e difíceis para a congregação inglesa, além de costumes
morais considerados muito libertinos, influenciando seus filhos que, pouco a
pouco, se tornavam mais holandeses, levando a congregação a temer que ela
viesse a ser extinta como cultura inglesa se ali permanecesse. Por volta
de 1617, Bradford relatou em texto o desencorajamento que a dura vida holandesa
estava provocando em parte da congregação, além da esperança de se encontrar
lugar melhor e mais fácil para viver, bem como o nascente desejo de propagar o
evangelho do Reino de Deus nas distantes terras da América. Com parte do grupo
em dificuldades financeiras e sem grandes oportunidades de ganharem seu
sustento, tendo mesmo alguns retornado para a Inglaterra, a época de decisão
parecia ter chegado. Havia, com certeza, medo do desconhecido, alimentado por
notícias de investidas coloniais que não deram certo, de nativos violentos, de
inúmeras dificuldades com relação à travessia por mar, doenças não conhecidas,
mas o ideal de uma Nova Inglaterra já povoava suas mentes. Virginia era um
destino possível, embora representasse uma colônia que reproduzia as condições
religiosas da Inglaterra, com a igreja anglicana estabelecida. Negociações para
um estabelecimento próximo à área, mas com independência nas decisões, foram
concluídas em 1619, no nome de John Wincob, com a condição imposta pelo rei de
que não se reconhecesse oficialmente o grupo religioso de Leyden, por serem
dissidentes. Em 1620, o Conselho de Plymouth recebeu o documento de
concessão real de um território ao norte da colônia de Virginia, já existente
na época, mas independente dela em seu governo.
Como nem todos os membros do
grupo pudessem viajar no mesmo ano com o primeiro grupo, foi decidido que
apenas os mais jovens e fortes partiriam na primeira expedição, ficando os remanescentes
para uma segunda viagem quando fosse possível. Robinson deveria permanecer em
Leyden com o grupo maior da congregação e Brewster lideraria a congregação
americana, havendo o entendimento de que ambas as congregações mantivessem
inicialmente um rol de membros único e uniforme.
Finalmente, em agosto de
1620, o Mayflower partiu com pouco mais de cem passageiros,
boa parte dos quais vieram de Leyden, sendo 28 adultos membros da congregação.
Após alguns meses, em dezembro do mesmo ano, com muitos incidentes de viagem,
morte de um dos tripulantes e nascimento de uma criança, cuja mãe estava
grávida ao embarcar, a viagem chegou ao fim e a colonização da Nova Inglaterra
começou. O nome dado à criança nascida durante a travessia foi
"Oceanus".
Por isso, enquanto os
ingleses reunidos na padaria de Amsterdam deram origem a uma nova concepção de
igreja que se tornaria em uma denominação das mais importantes no Novo Mundo,
os compatriotas de Leyden começaram aos poucos a colaborar com o início da
colonização norte-americana, na perspectiva de tentarem vida nova num mundo
novo.
1612 é o ano aceito pela
história como o da fundação da primeira igreja batista histórica inglesa,
aquela que teria continuidade, se firmaria e daria frutos. Smyth havia iniciado
sua concepção, Helwys dera continuidade e Murton o substituiria após sua prisão
e afastamento da liderança do trabalho, conforme já se viu.
1620 foi o ano no qual o
navio Mayflower trouxe da Inglaterra para a Nova Inglaterra os “Pais
Peregrinos”, com passagem pela Holanda, onde a idéia inicial havia recebido
adesão: um grupo de puritanos separatistas ingleses, que buscava novos ares e
liberdade para viver e cultuar a Deus da forma como imaginavam ser ideal. Não
deviam ser batistas os Pais Peregrinos ao chegarem a Plymouth, mas, tendo
conhecido os pioneiros batistas na Holanda, certamente conviveriam com inúmeros
outros batistas em anos posteriores, após o estabelecimento inicial da colônia,
já que muitos dentre os batistas também acabariam por optar mais tarde pelos
novos ares e pela liberdade no Novo Mundo. Afinal, entendiam todos que a Igreja
deixada por Cristo estava retratada no Novo Testamento e de lá buscavam a
inspiração para sua religião com Deus.
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